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Quíron, Metanóia e Consciência

por Marco Aurélio T. Fernandes

1. Introdução

O ser humano tem uma estrutura constitutiva muito complexa. Além da sua constituição do ponto de vista energético, podemos citar diretamente a constituição do ponto de vista bio-fisiológico, com a imbricação do funcionamento dos sistemas orgânicos, nervosos, do endócrino e do imunológico; a complexidade desse ‘organismo vivo’ (como um todo) nos permite perceber e expressar como e quanto é complicada a questão do ego versus a possível consciência de si, ao alcance do indivíduo como tal.

Se somarmos a essa percepção o fato de que usualmente ninguém vive sozinho, no sentido de que depende de um grupo familiar para nascer, crescer etc e do grupo social para se relacionar e exercer atividades profissionais, é facilmente aceitável que o contato de um indivíduo consigo mesmo (com seu interior, seus recursos, qualidades e talentos, bem como suas limitações, — aí incluída sua carga genética) não pode ser mecânico, mas sim, depende de um esforço consciente e (de preferência) consistente ao longo de sua vida.

Assim sendo, o contato e vínculo de um indivíduo com seu processo de individuação – que inclui a questão da saúde, num sentido amplo – depende do reconhecimento do e do interesse por seu ser interior. Saliente-se que esse interesse reflete um processo dinâmico, que pode se iniciar em qualquer época da vida do indivíduo, desde muito cedo até muito tarde. Independentemente disso – e enquanto isso, salvo exceções – o indivíduo se percebe na contingência de existir dentro do grupo familiar e do grupo social, nos quais deve desempenhar funções, que requerem sua participação no mundo exterior.

Em decorrência, o modo e a forma como o indivíduo se relaciona consigo mesmo e com o mundo que o cerca refletem a dinâmica do processo do seu bem-estar, que inclui a questão de sua saúde (no sentido amplo). Caso o indivíduo reconheça a necessidade do contato e vivência (do e) com seu ser interior, poderá colocar-se diante do processo que se tem chamado de metanóia (uma mudança do processo mental, um voltar-se para uma nova direção, para a Luz), o qual conduzirá a um desengajamento em relação à identificação (pura e exclusiva) com o mundo material e a um engajamento num processo de amadurecimento individual (ou individuação, no sentido estrito), o qual em última instância poderá conduzir à religação com o Self.

E podemos acrescentar que o desenvolvimento do ego na direção da totalidade só vai ser conseguido com a integração do corpo nesse processo, integração essa que implicará o equacionamento da referida questão da saúde. Um sintoma, qualquer que seja, quando visto como símbolo, expressa a necessidade de integrar um elemento novo ou reprimido na consciência.

Para James Hillman (1), fatores como sentimentalismo da personalidade, eficiência a todo custo, engrandecimento do poder e simples fervor religioso são fatores atuais que podem levar a doenças, destacadamente as cardíacas. Para ele, o infarto (que vem de farto, farctus = estufado, cheio) revela que o coração do homem moderno está congestionado pelas riquezas que não entraram em circulação, ou que foram constrangidas por estreitamentos, não tendo permissão para passar, riquezas estas que vêm do mundo da fantasia e da imaginação.

Poderíamos dizer que o ego, ao não dar passagem aos conteúdos inconscientes, aumenta a tensão interna, gerando angústia e ansiedades. Quando esses conteúdos estão associados a conflitos amorosos, por exemplo, o resultado pode ser uma sensação de disritmia e desarmonia amorosa. O coração doente expressa tanto a dissociação do ego com seu centro amoroso como a necessidade de religá-lo ao Self, para que a harmonia possa retornar.

Portanto, esse enfoque na religação do ego com o Self é fundamental para o estabelecimento do bem-estar do indivíduo – visto de maneira abrangente – e da sua saúde em particular, pois ele possibilitará o desenvolvimento do processo de individuação (Jung), que é importante para o ser humano. Ou seja, uma vez que o processo de individuar-se, de tornar-se o que a pessoa realmente é, resulta da interação do indivíduo também com o coletivo, quanto melhor essa sintonia com a própria essência, melhor o contato com o mundo ao redor — e o equilíbrio do ser integral se estabelece.

No seu trabalho clínico, um terapeuta, ao levar em conta o aspecto simbólico da doença orgânica, faz com que seu paciente entre em contato com imagens que emergem de seu inconsciente coletivo e pessoal, criando, deste modo, condições para uma compreensão mais profunda do dinamismo que se encontra alterado. Assim sendo, a relação do paciente com sua doença e recuperação está intimamente ligada ao seu processo simbólico.

Por outro lado, a inconsciência do significado simbólico dos problemas interiores mostra a nossa resistência em lidar com o dinamismo psíquico. Em conseqüência, podemos verificar que o sintoma corporal é um símbolo que expressa uma dissociação e revela um caminho. Depende do ego se ele vai ser compreendido, isto é, se vai ser dado a ele um significado ou se ele vai continuar sendo visto como algo que tem de ser eliminado ou ignorado. Essa eliminação, sem a consciência do significado, traz uma alta probabilidade de um sintoma aparecer e reaparecer, como atestam os inúmeros casos recorrentes de úlceras e doenças cardíacas, entre outros.

De acordo também com Denise Gimenez Ramos (2),

“A bússola do ego em direção à totalidade é dada pelo símbolo. Um desvio de rota também é revelado pelo símbolo e representado, com freqüência, pelo sofrimento. Mas, assim como o símbolo aponta o erro, pelo sofrimento envolvido, também aponta, pela compreensão de seu significado, a correção a ser feita, isto é, o que deve ser sacrificado. Entretanto, simplesmente pela forma com que um símbolo se apresenta (doença ou saúde), não podemos dizer se ele aponta para a necessidade de uma correção ou se revela uma próxima etapa a ser atingida no desenvolvimento normal. Em geral, as intenções se mesclam e de início a consciência não as discrimina.”

De um modo geral, os processos terapêuticos procuram diagnosticar o maior número possível de elementos que restrinjam a resposta natural do ser, desbloquear as suas restrições, encorajá-lo a confrontar seus desafios e desenvolver seus talentos e, em última instância, ajudá-lo a se situar na expressão espontânea de sua energia vital. Nesse sentido, um estudo astrológico (que deve incluir a análise do mapa natal, de progressões e de trânsitos num dado momento) pode ajudar de maneira inestimável um profissional qualificado para tanto; e a defesa deste autor é de que Quíron é muito importante nesse estudo.

2. Quíron, metanóia e consciência

Tendo como referência um enfoque amplo dos ciclos planetários considerados mais importantes (de Saturno a Plutão, passando por Quíron) –, do ponto de vista dos desafios, ou seja, das crises propiciadas pelas quadraturas, oposições e retornos, — pode-se perceber que ninguém passa incólume por notáveis influências na década dos 40 aos 50 anos, porque então se dá (sempre em termos aproximados) =

40 anos = oposição de Urano em trânsito a Urano natal;

42/43 anos = quadratura de Netuno em trânsito com Netuno natal;

44/45 anos = segunda oposição de Saturno em trânsito a Saturno natal;

45/46 anos = quadratura de Plutão em trânsito com Plutão natal…

De um modo geral, pode-se dizer que quem teve ou tiver boas sintonias ao longo dessa década, chegará aos 50 anos sentindo uma espécie de renascimento, que ocorre logo após um dos retornos de Júpiter (aos 48 anos); e é por isso que mais adiante se fala em redirecionamento, que tem a ver com a metanóia citada anteriormente.

E então, é aqui que se pode incluir o desafio de Quíron, cuja órbita se situa a maior parte do tempo entre a de Saturno e a de Urano, constituindo basicamente uma ‘ponte’ entre ambos e cujo ciclo (retorno) se dá por volta dos 51 anos da pessoa; como sua órbita é bastante excêntrica e segue uma elipse, passa muito mais tempo em alguns signos do que em outros, razão por que suas quadraturas e oposições variam muito em percurso (tempo), dependendo do ‘lado’ do Zodíaco em que se encontra (mas não se mencionam aqui indicações a respeito delas, porque isso seria muito extenso – v. também o artigo ‘Quíron e seu mito’, neste site).

Assim sendo, do ponto de vista da ‘cura’ do ser humano, a ‘chacoalhada’ final (esticando aquela década para cerca de 11 anos) se dá com esse retorno de Quíron. Em seu ótimo livro “Quíron e a jornada em busca da cura”, Melanie Reinhart considera que ‘a configuração de Quíron quase sempre descreve o tipo de conexão existente entre o indivíduo e seu sofrimento interno, bem como um caminho passível de levá-lo à cura… e também descreve a natureza da cura que a pessoa pode oferecer aos outros. Essa faculdade é observada quer a pessoa trabalhe ou não profissionalmente no campo da cura, porquanto se trata mais de uma qualidade natural, de uma emanação, do que de uma técnica aprendida’.

Desta forma, Quíron indica o ‘curador ferido’, a área onde sentimos medo (o que também é representado por Saturno) ou onde sofremos dor ou danos, mas, se processado e compreendido adequadamente, podemos aprender muito com ele: ou seja, para dissolver nossa dor existencial, podemos desenvolver nossa ‘metade superior’ (dharma) à custa da ‘metade inferior’ (karma), o que nos remete à própria imagem de Quíron, cuja metade superior era representada pelo curador sábio, e a metade inferior, pelo animal ferido.

De acordo com Bárbara Hand Clow (ver adiante), o glifo de Quíron parece uma ‘chave’, que pode ser interpretada como a chave para a busca da transmutação / transformação pessoal; e ela expressa que ele é estreitamente ligado com seu meio-irmão Júpiter, o tradicional regente de Sagitário e da Casa Nove – áreas do mapa astral ligadas com buscas de todos os tipos. Por essas razões é que se considera que em sua interpretação básica Quíron pode ser considerado como conferindo significados mais concernidos (e vinculados com o nível espiritual) para o indivíduo, de acordo com sua colocação no mapa natal, em virtude do que este autor defende seu uso nos estudos de orientação vocacional (para jovens, sobretudo em torno de seus 17-18 anos) e redirecionamento de carreiras profissionais.

Por outro lado, é evidente que Quíron, como qualquer corpo ou ponto no mapa natal, percorre por trânsito toda a circunferência, portanto fazendo aspectos diversos com todos os outros corpos e pontos. Assim sendo, ele pode ser levado em conta em qualquer estudo astrológico que analise de forma mais aprofundada os concernimentos do indivíduo com os significados mais profundos da vida, razão pela qual também deve ser levado em conta nos estudos de saúde, aqui considerada como o equilíbrio dinâmico resultante da sintonia básica do mesmo com o Divino (sua origem e destino como Ser).

De outro ponto de vista, em se levando em conta a dinâmica representada na Astrologia pelas progressões e trânsitos, conforme expressa Bárbara Hand Clow (3), ‘os trânsitos planetários são uma oportunidade de acelerar as vibrações com o crescimento. É nossa resposta celular à própria vida e, se conseguimos evitar o trabalho de um dos trânsitos, começamos a morrer naquele ponto.’ Segundo ela, o primeiro retorno de Saturno dinamiza uma ‘crise física’; a oposição de Urano em trânsito com Urano natal, uma ‘crise emocional’. E o retorno de Quíron, a ‘crise da consciência’, o que confere um significado especial para esse retorno e a época correspondente, na vida das pessoas.

É importante destacar ainda que, sendo o tempo orbital de Quíron nos signos bastante variável, e estando ele atualmente no signo de Aquário, começou recentemente a percorrer a parte mais longa daquele tempo orbital (que é completado por Peixes, Áries e Touro: ele entrará em Gêmeos somente em maio/2034, o que significa que estará ocupando de Aquário a Touro durante 29 anos, ou seja, nos quatro signos em questão ele estará demorando cerca de 56% do total de seu tempo orbital ). Além disso, é mais importante ainda ressaltar que, estando o Ascendente do mapa da descoberta de Quíron a 26°04’ de Sagitário, está ele em conjunção com o centro de nossa galáxia (atualmente a 26°56’), e que Plutão atingiu esse grau (26° de Sagitário) em fevereiro deste ano (2006), o que nos permite interpretar que o poder transformativo representado por Plutão atualmente está transmitindo um influxo especial para Quíron, conferindo a este um maior poder de transformação (vale lembrar que Plutão entrará em Capricórnio somente em janeiro/08). Para enriquecer ainda mais esses significados, destaca-se que o símbolo sabiano para a posição de Quíron no mapa de sua descoberta (a 03°09’ de Touro) menciona ‘o pote de ouro no fim do arco-íris’; Dane Rudhyar (4) dá a chave para esse significado, como a plenitude que flui da conexão com a natureza celestial (ou divina), e sugere que aponta para algum tipo de transubstanciação da matéria.

Assim sendo, é fácil perceber que Quíron está atualmente contribuindo sobremaneira para que as pessoas imprimam um redirecionamento a suas vidas, voltando-se mais para os focos relacionados com o mundo interior, do amadurecimento como indivíduos e seres humanos – e portanto do desenvolvimento (e evolução) de suas consciências. Conforme apontado anteriormente, é natural que se espere mais o que acaba de ser apontado, de pessoas que já tenham passado pelo retorno de Quíron. Em qualquer caso, entretanto, o potencial do indivíduo deve ser examinado no seu mapa natal e nos trânsitos mencionados, com destaque para a colocação de Quíron (por signo e Casa) e os aspectos que ele tenha com os demais pontos do mapa; e também a progressão por arco solar e o trânsito atualizado (incluindo signo, Casa e aspectos, conforme citado anteriormente): tal estudo, completo, poderá fornecer as diretrizes para a dinâmica do processo supracitado, o qual, em última análise, deve conduzir para a realização do indivíduo como Ser Humano.

Marco Aurélio T. Fernandes

Arquiteto de formação; participou ativamente, durante muitos anos, de Grupo ligado ao chamado ‘Quarto Caminho’, que tem como base os ensinamentos de G.I.Gurdjieff. Foi ali que teve o interesse despertado pela Astrologia, Cabala e Tarô. No início da década de 80 teve um curso de formação com Lydia Vainer, quando ‘descobriu’ áreas específicas da Astrologia, como a Médica e a Vocacional, tendo estudado muito desde então estas duas. Estudou (e procurou conhecer o trabalho de) muitos astrólogos renomados, com destaque mais recentemente para a Márcia Mattos e o Noel Tyl.

Elaborou site www.chiron.com.br

Quíron, Metanóia e Consciência